top of page

COMPLEXIDADES NA RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS EM RONDÔNIA-BRASIL

Atualizado: 23 de ago. de 2022



*Kenia Michele de Quadro Tronco



A Legislação Ambiental de número 12.651 está vigente desde maio de 2012 e dispõe sobre a proteção da vegetação nativa. Essa lei foi alicerçada principalmente no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e no Programa de Regularização Ambiental (PRAs), que tem como mecanismo de ordenação os Projetos de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas (PRADAs). A nova regulamentação trouxe grandes mudanças em relação à legislação passada, pois foi a primeira vez que os produtores rurais puderam indicar os passivos ambientais localizados em suas propriedades e assim receber benefícios pelas áreas demarcadas.


Então, os proprietários que, por meio do CAR indicarem os passivos ambientais e aderirem ao Programa PRA, assinando o Termo de compromisso (TC) e se comprometendo a se regularizar, seja em Áreas de Preservação Permanente (APPs) ou em Áreas de Reserva Legal (RL), acenam que estão dispostos a auxiliar no processo de recuperação ambiental. Como contrapartida, esses poderão se beneficiar com linhas de créditos e programas governamentais de incentivo à produção e comercialização.


Importante salientar que cada Estado possui suas particularidades em relação ao PRA. Nesse contexto, o estado de Rondônia implantou o PRA por meio da edição do Decreto n.º 20.627, de 08 de março de 2016. Esse foi um marco de grande importância para Rondônia, oferecendo ao Estado a oportunidade de sair das estatísticas de desflorestamento, e alavancar na produção sustentável.


Em Rondônia, no ano de 2019, 55,8 % dos municípios possuíam cobertura vegetal inferior a 50% e, destes, 13 municípios com menos de 20% de florestas nos seus territórios (INPE, 2019). Destaca-se que a maioria dessa perda ocorreu como consequência da conversão de florestas em agricultura e pasto, pois Rondônia está entre os maiores produtores de gado do Brasil.


Importante frisar que grande parte das áreas convertidas para pasto, hoje são em sua maioria, áreas abandonadas e subutilizadas. Contudo, com o uso de tecnologias, é possível aumentar a produtividade sem a necessidade de aumentar a área de pasto, e consequentemente, sem aumentar o desflorestamento.


Diante desses fatos, pergunta-se: Porque, após dez anos de nova legislação ambiental vigente, Rondônia não se destaca como um Estado que mitigou os passivos ambientais?


Aqui é preciso destacar que o problema vai muito além das questões econômicas e ecológicas, sendo preciso entender todos esses aspectos locais que atravessam, desde a colonização do Estado, a questões culturais, entre outros.


Por primeiro, a colonização de Rondônia se deu essencialmente por Projetos Integrados de Colonização (PICs), com maior força de trabalho familiar, assentando milhares de famílias no território entre 1960 e 1970. Esse processo de colonização do Estado se deu por meio da organização do espaço urbano, com estradas tipo “espinha de peixe”, onde as famílias eram assentadas linearmente. Entretanto, essa ocupação não considerou as áreas dos ecossistemas naturais, fato que por si só já acarretou um grande impacto, visto que havia a concepção que os recursos naturais eram infinitos, não necessitando de maior zelo em seu uso. Ademais, após acomodados em pequenos lotes, os produtores eram incentivados a desflorestar, assim garantindo seu estabelecimento e esperança de ganho de novos lotes.


Nesse momento, a dicotomia entre floresta e desenvolvimento estava estabelecida. Então, o histórico de colonização do Estado acabou pesando culturalmente, já que o produtor rural entendia o desflorestamento como questão de permanência no território. E assim, questões históricas formaram fortes laços com o cotidiano e, por vezes, mesmo sem ter nexo, acabam sendo difundidas indiscriminadamente, se transformando hoje no receio da perda de áreas pelos produtores.


Dito isso, a recuperação de áreas e o plantio de árvores precisam ser vistas com parcimônia. A falta de propriedades rurais que sirvam como Unidades Modelos de Recuperação, seja com Sistemas Agroflorestais, plantio de mudas ou semeadura direta, acentuam essa condição. É fato que já existem algumas Unidades modelos, poucas, e justamente vinculadas a projetos que iniciaram no período de transição entre as legislações ambientais. Mas essas não tem o alcance necessário, ficando a desejar a articulação com todos os atores desse processo de recuperação de áreas degradadas, seja em APP ou em RL.


Hoje, a importância da manutenção da floresta é real. Tanto que, em 13 de janeiro de 2021 entrou em vigor a Lei nº 14.119 que institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais. Os serviços ecossistêmicos da floresta são classificados em 4 categorias: provisão, regulação, suporte e cultural. Dessa maneira, é possível vislumbrar o ecossistema, não só como doador de produtos madeireiros e não madeireiros, mas também como local de bem estar para corpo e mente, local que propicia a manutenção e perenidade da vida, em quantidade e qualidade. Entretanto, para estimular tais ambientes, ainda não existem protocolos de mensuração dos serviços ecossistêmicos, dado a grande complexidade, dinâmica e interação dos ecossistemas, dificultando a precificação dos serviços da floresta. E, mensurar o valor da floresta em pé requer o conhecimento desses processos que interconectam cada elemento desse ecossistema. Logo, a real dimensão da importância da floresta e todos seus benefícios relevantes para a sociedade fica restrito à comunidade científica.


Para o sucesso de qualquer ação de recuperação, os produtores precisam estar envolvidos no processo desde o início. Então, eles devem participar do máximo de etapas possíveis, desde a escolha das espécies possíveis a serem inseridas, das metodologias de trato e até o monitoramento. Só assim é que os produtores irão se apropriar das ações, sendo que esses poderão se tornar multiplicadores de ideias sustentáveis, envolvendo posteriormente toda a comunidade na causa.


Outra grande dificuldade nos projetos de recuperação a nível nacional relaciona-se com a falta de sementes florestais. Isso porque muitas espécies perdem a viabilidade de suas sementes com o armazenamento, outras estão localizadas em locais muito específicos, por vezes de difícil acesso, também há espécies que produzem quantidade mínima de sementes anuais e também existem aquelas com copas extremamente altas e sementes minúsculas e a coleta fica inviável.


Sendo assim, a criação de redes de apoio e parcerias entre Instituições no Estado de Rondônia tendem a fortalecer a cadeia de coleta e armazenamento de sementes florestais.


Quanto às ações de produção de mudas e plantio no campo, essas devem ser organizadas no período de seca e chuva. No período de seca, quando a quantidade de chuva é ínfima em Rondônia, não é indicada para o plantio a campo. Então, nesse período, os viveiros de produção de mudas estão com lotação máxima, esperando o início das chuvas, lá por meados de novembro, pois do contrário, a mortalidade de mudas é alta.


Em relação às espécies a serem utilizadas, o ideal seria ter o conhecimento anterior da vegetação do local. Como isso muitas vezes não é possível, utiliza-se as espécies ocorrentes nos fragmentos florestais próximos, após o inventário dessas áreas. Enfatiza-se a importância da confiança pelo produtor rural no profissional que está à frente das ações de recuperação.


Frisa-se que recuperar área degradada não se resume em apenas “plantar árvores”. Envolve desde a restauração ecológica, quando inicia o processo de sucessão florestal, até o momento em que o ecossistema consegue por si se manter em dinâmica e equilíbrio, com as suas relações ecossistêmicas. Por isso, é urgente a necessidade de protocolos que auxiliem a balizar uma restauração ecológica de qualidade, visto que diferentes métodos podem ser utilizados de acordo com o grau de resiliência da área.


O Estado ainda carece de referências relacionadas aos custos de recuperação da cobertura florestal de áreas alteradas e/ou degradadas. Esses custos variam conforme a intensidade de uso dado aos solos, sendo tanto mais exigente e de alto valor financeiro, quanto maior for o nível de degradação do local. O valor estimado para a recuperação de área degradada no Estado de Rondônia gira em torno de R$ 29.145,90 por hectare no ano de 2021 (TRONCO et al., 2021)..


Todavia, diferentes cenários de degradação e recuperação precisam ser elencados, trazendo as várias formas e graus de degradação, atrelados aos diferentes métodos possíveis e seus custos.


E por todo esse cenário, a recuperação é vista como dificultosa e complicada. Mas, a grande dificuldade se dissipa quando essas ações são apoiadas, os atores são ouvidos e há o consenso entre todos. Por isso, a responsabilidade é da Academia, das Instituições, do Governo, da comunidade e do produtor, que juntos podem impulsionar Rondônia para a união do crescimento econômico e florestas.



93 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page