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Agricultura regenerativa ganha protagonismo na COP30 e reforça eficiência do projeto Regenera Cerrado

Atualizado: há 3 dias

Modelo de sistema agrícola reúne práticas que preservam o solo, reduzem emissões e fortalecem biomas brasileiros


Foto: Wanderson Manenti
Foto: Wanderson Manenti

Um dos temas debatidos durante a 30ª Conferência das Partes (COP30), realizada entre os dias 10 e 21 de novembro, em Belém (PA), foi a agricultura regenerativa. Representantes de vários países participaram do encontro, comprometidos em apresentarem soluções capazes de frear os impactos acelerados das mudanças climáticas no planeta.


Esse modelo de produção agrícola vem ganhando destaque por propor práticas que restauram e melhoram a saúde dos solos, ampliam a biodiversidade e fortalecem os ecossistemas. Para o Brasil, país cuja economia depende fortemente da agricultura e da pecuária, trata-se de uma estratégia essencial para unir produtividade, rentabilidade e sustentabilidade ambiental.


Nesse contexto, o projeto Regenera Cerrado, desde 2023, vem comprovando cientificamente a eficiência das práticas regenerativas quando comparadas ao manejo convencional. Por meio de técnicas como redução do revolvimento do solo, aumento da cobertura com resíduos orgânicos, diversificação de culturas e uso de controle biológico de pragas e doenças, o projeto demonstra que é possível produzir mais e melhor, conservando os biomas.


O Regenera Cerrado se consolidou como uma das principais referências nacionais em pesquisa aplicada e difusão de práticas regenerativas nas culturas de soja e milho. Ao longo de três anos, uma rede de pesquisadores, bolsistas e produtores monitorou 1.615 hectares de lavouras no sudoeste de Goiás.


Os resultados inéditos da primeira fase contemplam indicadores de saúde do solo, dinâmica da biodiversidade e rentabilidade econômica, oferecendo ao setor produtivo um modelo sólido para a transição e ampliação da agricultura regenerativa no Cerrado brasileiro.


Solução agrícola de baixo carbono

Para o professor emérito da UFLA (Universidade Federal de Lavras – MG) e conselheiro do Fórum do Futuro, José Oswaldo Siqueira, a agricultura regenerativa posiciona o Brasil para liderar globalmente a produção de baixo carbono.


“Se computarmos as atividades agropecuárias somadas às mudanças no uso da terra nas últimas décadas, cerca de 70% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa são provenientes desse setor. Dessa maneira, alguns dos pressupostos básicos da agricultura regenerativa são justamente os sistemas agrícolas de baixo carbono e manejos que diminuem consideravelmente a degradação do solo”, afirma.


Siqueira lembra que o projeto começou na região de Rio Verde (GO), com a ideia de seis produtores adotando sistemas regenerativos. Hoje, são mais de 60 propriedades, impulsionadas pelos resultados apresentados pelos produtores e pesquisadores.


“O projeto começou no bioma Cerrado, mas é possível escalonar as técnicas para outros ecossistemas nacionais. Contudo, não se trata de replicar o manejo, e sim de aplicar os fundamentos da metodologia regenerativa. Cada bioma exige modelos compatíveis com sua realidade ambiental”, explica.


Pesquisa multidisciplinar e olhar humanizado

Para Eliana Fontes, pesquisadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (CENARGEN) e coordenadora técnico-científica do Regenera Cerrado, o ponto de partida foi ouvir as necessidades dos produtores da região.


“Procuramos entender a realidade de cada propriedade, quais fatores dificultavam a implantação das práticas de agricultura regenerativa e as oportunidades que poderiam ser aproveitadas. Só depois de compreender as demandas específicas dos agricultores começamos a construir, juntos, as estratégias mais adequadas para cada um”, detalha.


Para acomodar a complexidade das questões científicas elencadas nas conversas com os produtores, foi adotada uma abordagem multidisciplinar. Eliana explica que esta abordagem é aplicada quase que rotineiramente pela Embrapa, empresa onde trabalha, reunindo especialistas de diferentes áreas para interpretar os desafios sob perspectivas complementares. Essa visão integrada favorece soluções completas e ajustadas às realidades locais.


“Se o desafio, por exemplo, envolve desenvolver um bioinsumo, temos acesso a um vasto banco de microrganismos; selecionamos cepas de alto valor, realizamos análises avançadas e transformamos esse conhecimento em produtos e recomendações que chegam diretamente ao produtor. Esse processo normalmente envolve diferentes especialistas”, pontua Eliana.


A pesquisadora reforça ainda que, antes de iniciar as atividades, foram avaliados três pilares: científico, técnico e humano. “O objetivo desde o início da criação do Regenera Cerrado foi aproximar a ciência do campo, traduzir conhecimento em práticas sustentáveis e apoiar o produtor na construção de sistemas agrícolas mais produtivos, resilientes e alinhados à conservação ambiental”, conclui Eliana.


Produção comercial adaptada para agricultura regenerativa

A produtora rural e engenheira agrônoma Maria Vitória Constantin Vasconcelos, da Fazenda Mata do Lobo (Rio Verde – GO), será uma das participantes da nova fase do Regenera Cerrado. Com dez anos de experiência na atividade agrícola, ela lembra que, em 2015, a produção da família ainda seguia o modelo de monocultura de grãos, sistema vulnerável e dependente de insumos externos.


“Diante desse cenário, iniciamos a busca por alternativas que tornassem nossa agricultura menos frágil e mais eficiente. Foi nesse processo que nos deparamos com os princípios da agricultura sintrópica. Essa abordagem demonstrou a eficiência do sistema produtivo baseado em processos naturais. Por isso, decidimos iniciar um sistema agroflorestal com café”, relata.

A escolha do café ocorreu por ser uma cultura de alto valor agregado, com rastreabilidade, forte apelo narrativo e excelente adaptação a sistemas sombreados. O resultado surpreendeu: redução de custos, manutenção da produtividade e melhoria expressiva da qualidade do café,  mesmo em uma região que não é tradicional nesse cultivo.


“Como resultado, conseguimos reduzir custos de produção e ampliar discretamente a produtividade em comparação ao período anterior à adoção das práticas regenerativas, fortalecendo tanto a sustentabilidade econômica quanto a ambiental da fazenda”, explica.


Para Maria Vitória, integrar o Regenera Cerrado representa mais do que participar de um projeto: é validar cientificamente o que se observa no campo.


“A construção desse respaldo técnico e científico fortalece nossa confiança e segurança para avançar no caminho da inovação. Ver a agricultura reconhecida como parte da solução climática, e não apenas do problema, reforça nossa convicção de que práticas regenerativas têm papel estratégico na conservação do Cerrado. É motivo de orgulho contribuir com essa transformação”, finaliza.


Sobre o Projeto Regenera Cerrado

Idealizado pelo Instituto Fórum do Futuro em 2022, o Regenera Cerrado tem como propósito disseminar práticas de agricultura regenerativa validadas cientificamente, oferecendo um modelo escalável de produção de soja e milho para o Brasil e o mundo.


Nesta segunda fase, o projeto segue com o patrocínio da Cargill, conta com a coordenação técnico-científica da Embrapa e execução operacional do Instituto BioSistêmico (IBS), além da parceria de sete instituições nacionais e 10 fazendas localizadas na região de Rio Verde, no sudoeste goiano.


As instituições parceiras são: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), Grupo Associado de Agricultura Sustentável (GAAS), Grupo Associado de Pesquisa do Sudoeste Goiano (GAPES), Instituto Federal Goiano, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade de Brasília (UnB).

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