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A LOTERIA REGIONAL DA VIDA




Paulo R. Haddad


Qual a diferença entre o futuro de um brasileiro que nasce no interior do Nordeste e o futuro do brasileiro que nasce em uma das áreas mais desenvolvidas do Sul ou do Sudeste? Do ponto de vista econômico, a resposta pode estar nas condições de vida e no campo de oportunidades para quem nasce nas áreas desenvolvidas, nas quais são quase três vezes superiores às condições de vida de quem nasce nas áreas menos desenvolvidas do País.


Uma diferença que pode ser observada estatisticamente através dos indicadores de renda, trabalho, habitação, educação, saúde e segurança que caracterizam como vivem as famílias brasileiras em cada região. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD-C) do IBGE, a renda domiciliar per capita do Brasil, em 2022, foi de R$1.625. A Unidade Federativa com maior renda média do Brasil foi o Distrito Federal com R$ 2.913, seguido de São Paulo com R$ 2.148. O Estado do Maranhão teve a menor renda (R$ 814), seguido de Alagoas (R$ 935). A Região Centro-Oeste apresenta o maior rendimento regional no valor de R$ 2.011 e a Região Nordeste o menor valor R$ 1.053. Caracteriza-se, assim, a questão da persistência dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento no Brasil


É grande a insatisfação dos brasileiros que vivem em áreas economicamente deprimidas (Agreste e Sertão do Nordeste, Vales do Jequitinhonha e do Mucuri, etc.); em áreas desmatadas mais antigas da Amazônia; em áreas em processo de decadência econômica (Vale do Ribeira, Metade do Sul do RS); em áreas desertificadas com baixo potencial de desenvolvimento (17% do Território Nacional). Uma das formas de manifestar essa insatisfação ocorre através da migração inter-regional ou da busca inconformada de alternativas político-institucionais para a construção do seu desenvolvimento futuro.


Podemos observar a insatisfação da população brasileira com a atual geopolítica do País pelo grande número de projetos de lei que estão no Congresso Nacional, demandando o redesenho da regionalização político-institucional do País, através da criação de novos Estados e Territórios, destacando-se: o Estado do Tapajós, o Estado do Solimões, o Estado do Oiapoque, o Estado de Carajás, o Estado do Maranhão do Sul, o Estado do Gurgueia (PI), o Estado do Maranhão do Norte, o Estado do Araguaia, entre outros, como ocorreu com a demanda do Triângulo Mineiro, nos anos de 1970.


Quando um país consegue reduzir os processos de desequilíbrios regionais de desenvolvimento através de políticas consistentes, convergindo as condições de vida das regiões mais pobres para as condições de vida das regiões mais ricas, é preciso que consolide, sustente e reinvente as políticas públicas para evitar a reversão desses desequilíbrios e a convergência ao longo do tempo.


No caso brasileiro, a região economicamente menos desenvolvida era o Nordeste. No Governo JK, em 1959, foi criada a SUDENE para promover o desenvolvimento da Região, tendo, à frente da Superintendência, a liderança intelectual de Celso Furtado. Durante as três primeiras décadas, as políticas públicas conseguiram induzir o crescimento econômico regional, através de um sistema de incentivos fiscais e de intensos investimentos em infraestrutura econômica e social do Governo Federal. Nesse período, em diversos anos, as taxas de crescimento da Região foram superiores ao crescimento médio nacional.


No século 21, a posição relativa do PIB do Nordeste no PIB brasileiro tem oscilado entre 13 e 14%, sendo que, nos anos de 2018 e 2019, o PIB nordestino cresceu praticamente a metade do PIB nacional, o qual foi apenas de 1,1 % ao ano. O PIB mede o crescimento econômico e a renda per capita o bem-estar social das famílias.


Pode-se dizer que, no Nordeste, o velho modelo de crescimento econômico regional não morreu e o novo modelo de desenvolvimento sustentável ainda não nasceu. O velho modelo muito dependia do aporte direto ou indireto de volumosas transferências de recursos do Governo Federal, que passa atualmente por uma profunda crise fiscal e financeira. E o novo modelo de desenvolvimento sustentável esbarra no déficit de capitais e valores intangíveis da Região (social, institucional, humano, empreendedorismo, etc.) os quais são responsáveis, em última instância, por resgatar, endogenamente, a Região das entranhas do atraso econômico e da pobreza social.


Mantidas as atuais taxas de crescimento do Nordeste e do Brasil, serão necessárias muitas décadas para que a Região e os seus Estados atinjam 70% do PIB per capita do País. Uma assimetria espacial no padrão de vida dos brasileiros, que é politicamente intolerável em uma democracia federativa moderna na “nossa casa comum”.


Trata-se de uma questão estrutural que não se equaciona apenas através das políticas de ajustes macroeconômicos de curto prazo que vêm sendo implementadas desde 2014. Necessitamos de retomar as políticas de desenvolvimento regional renovadas, dentro de um estilo de planejamento de longo prazo mais leve, mais flexível, mais operacional, mais indicativo e mais participativo.



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