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SEIS IDEIAS À PROCURA DE UM ESTADISTA

Atualizado: 8 de abr. de 2022

V. A LOTERIA REGIONAL DA VIDA E A LIÇÃO DO BUDISMO






Ex-Ministro da Fazenda e do Planejamento (Governo Itamar), Paulo Haddad, Conselheiro do Fórum do Futuro foi buscar em Pirandello a inspiração para trazer essa nova e instigante série do nosso Site. Serão seis capítulos, publicados semanalmente.


Hoje trazemos o quinto capítulo:


A LOTERIA REGIONAL DA VIDA E A LIÇÃO DO BUDISMO


*Paulo Roberto Haddad


1. Os desequilíbrios regionais de desenvolvimento: o Budismo nos ensina que não há nada mais democrático do que o sol que, quando se levanta, ilumina igualmente todas as regiões. Não tem sido o caso do desenvolvimento regional no Brasil, um país com imensas dimensões geográficas, inequívocas heterogeneidades socioculturais e um processo democrático em consolidação, mas um país dividido territorialmente entre regiões e áreas mais ricas e regiões e áreas mais pobres.


Por não carregarmos, em nossa herança histórica, a formação de enclaves culturais, linguísticos ou religiosos regionalmente organizados, a distribuição desigual da prosperidade econômica entre regiões tem possibilidade de emergir, fundamentalmente, por força da difusão assimétrica da dinâmica capitalista no espaço.


Podemos observar a insatisfação da população brasileira com a atual geopolítica do País, pelo grande número de projetos de lei que estão no Congresso Nacional demandando o redesenho da regionalização político-institucional do País, através da criação de novos Estados e Territórios, destacando-se: o Estado do Tapajós, o Estado do Solimões, o Estado do Oiapoque, o Estado de Carajás, o Estado do Maranhão do Sul, o Estado do Gurgueia (PI), o Estado do Maranhão do Norte, o Estado do Araguaia, entre outros.


Se desconhecermos a motivação de interesses político-eleitoreiros, os interesses velados de natureza econômica ou as motivações sentimentais de pertencer a uma região específica, essas manifestações para a criação de novos Estados e territórios podem ocorrer por forças históricas, quando (segundo Anne Markusen):


a. há separação territorial entre a esfera das atividades de produção e a esfera das atividades de circulação – por exemplo, regiões que geram volumosos excedentes agrícolas sentem-se espoliadas por interesses econômicos de outras regiões que financiam, transportam e comercializam as safras - com ganhos desproporcionalmente elevados; esse argumento tem emergido frequentemente entre lideranças políticas das regiões agrícolas do Centro-Oeste, onde se pleiteiam políticas econômicas para ampliar o valor agregado de sua produção localmente, principalmente quando essas lideranças julgam, como os Fisiocratas desde o século 18, que apenas o setor agropecuário cria valor ou excedente econômico;


b. as regiões especializam suas estruturas produtivas em um regime de trocas desiguais no comércio inter-regional – por exemplo, uma região se especializa na produção de alimentos e materiais não beneficiados e adquire, de outras regiões, bens manufaturados de consumo e de produção, através de relações de troca que se deterioram ao longo do tempo; esse argumento aparece de forma explícita no documento final do GTDN (Grupo de Trabalho de Desenvolvimento do Nordeste), que foi determinante para a criação da SUDENE, em 1959;


c. modos de produção conflitivos coexistem no mesmo tempo histórico, embora diferenciados territorialmente – por exemplo, o modo de produção de uma região é de mão de obra escravizada, e o da outra é de mão de obra livre, como no contexto histórico da Guerra Civil dos EE.UU., no século 19;


d. as instituições públicas e privadas das áreas mais desenvolvidas de um país pretendem, através da manipulação de sua força de decisão em nível do poder público central, definir a forma, a intensidade e a cronologia do uso dos recursos naturais e dos recursos energéticos das áreas menos desenvolvidas, particularmente aquelas localizadas na fronteira externa da expansão da economia nacional; esse argumento está presente nos debates sobre o futuro de algumas áreas da Amazônia, que se sentem verdadeiros almoxarifados de recursos naturais (minérios, madeiras, recursos hídricos) a serviço das áreas desenvolvidas do País.


No caso brasileiro, os conflitos de interesses regionais têm aparecido historicamente em dois níveis espaciais: no nível inter-regional e no nível intraestadual. Particularmente nas Unidades da Federação de maior dimensão geográfica das Macrorregiões Norte e Centro-Oeste era de se esperar que, mais cedo ou mais tarde, aparecessem movimentos regionalistas, por diferentes motivos. Entre esses motivos, destacam-se as dificuldades das máquinas administrativas das Unidades da Federação em realizar uma gestão eficaz (“fazer as coisas certas”) e eficiente (“fazer certo as coisas certas”) de todo o seu território estadual, assim como em prover todas as suas principais regiões com infraestrutura econômica e social adequada, de tal forma que algumas de suas áreas não se sintam isoladas ou separadas do conjunto do território estadual.


No nível inter-regional, os antagonismos econômicos provocados pelas disparidades regionais de desenvolvimento têm constituído a principal base potencial para impulsionar tensões e conflitos entre interesses políticos regionais. Embora os diferentes ciclos econômicos de curto prazo, ocorridos desde a crise de 1929, possam ter exacerbado esses conflitos e tensões durante as suas fases de expansão e de contração, através da absorção diferenciada entre as regiões dos seus custos ou benefícios, a questão dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento apresenta-se como um fenômeno estrutural e recorrente a alimentar esses possíveis antagonismos que surgem na disputa dos recursos orçamentários e financeiros da União, assim como na configuração das políticas públicas do Governo Federal.


2. Quando a pobreza enraíza no espaço geográfico: François Perroux, o principal economista francês do pós–II Grande Guerra, que se destacou como pioneiro na concepção da União Europeia (“A Europa Sem Fronteiras”), afirmava, em 1950, que o desenvolvimento é um processo seletivo e acumulativo que não aparece em todo lugar ao mesmo tempo, mas torna-se manifesto em certos pontos do espaço, com intensidade variável. De fato, pode-se observar essa assimetria em diferentes países mais desenvolvidos (EE.UU., Itália, etc.) e em outros países menos desenvolvidos (Índia, Venezuela, etc.).


O grande problema a merecer especial atenção das funções de mitigação, de compensação e de promoção dos sistemas nacionais de planejamento, ocorre quando a pobreza se enraíza no espaço geográfico, formando áreas economicamente deprimidas. É o caso da questão regional brasileira, onde quase dois mil dos 5.570 municípios se localizam em áreas economicamente deprimidas.


Uma área economicamente deprimida se caracteriza como um conjunto de municípios com baixo nível de PIB per capita (inferior a 30 por cento do PIB per capita brasileiro), elevados índices de pobreza e de carência de serviços sociais básicos, insuficiência de absorção de mão de obra (elevadas taxas de desemprego aberto, de subemprego ou desemprego disfarçado). Essas áreas se encontram, principalmente, no Sertão e no Agreste do Nordeste do País, nos Vales do Jequitinhonha e do Mucuri, no Norte de Minas, em áreas desmatadas da Amazônia, em quatro Microrregiões do Vale do Rio Doce, entre outras.


Essas áreas têm em comum o fato de que utilizaram, historicamente, a sua base de recursos naturais renováveis de forma predatória (florestas tropicais – Mata Atlântica e Amazônia) e não renováveis (ciclos do ouro e do diamante em Minas). Na perspectiva da Ecologia Integral não se pode segmentar de forma isolada e parcial os indicadores de desenvolvimento humano e os indicadores de sustentabilidade ambiental. A evolução da Humanidade e a evolução da Natureza são consideradas capítulos da mesma história.


Essa integração se processa através dos modelos de desenvolvimento do território que prevalecem em cada tempo histórico e em cada espaço geográfico. São os modos de consumo, de produção e de acumulação, conjugados com a organização espacial do território. É no processo de ocupação e desenvolvimento (aménagement) do território que ocorre a integração dialética entre Homem e Natureza.


O Papa Francisco afirma, em sua encíclica LAUDATO SÍ, de 2015, que não estamos diante de duas crises separadas, uma ambiental e outra social, mas de uma crise complexa que é, ao mesmo tempo, social e ambiental. É essencial encontrar soluções e estratégias abrangentes que considerem as interações entre os próprios sistemas naturais com os sistemas sociais.

O processo de desenvolvimento sustentável define que o valor de um recurso ambiental (floresta, água doce, biodiversidade, clima ameno, ar puro etc.) é igual à soma do valor de uso e do valor de não uso. O valor de não uso considera o legado dos benefícios dos recursos ambientais que serão herdados pelas futuras gerações, os netos e bisnetos dos brasileiros de hoje. No caso das áreas economicamente deprimidas, onde o valor dos ativos ambientais e dos serviços ecossistêmicos foi destruído no passado, os indicadores socioeconômicos e socioambientais registram incontestáveis custos ecológicos e sociais.


E quem paga os custos dessa nefasta dívida histórica? É evidente que há custos que são inestimáveis. Outros são compensados através de políticas públicas. As populações das áreas economicamente deprimidas são beneficiárias, ainda que de forma precária, de políticas sociais compensatórias, financiadas pela carga tributária que pesa sobre as regiões mais desenvolvidas, enquanto suas Prefeituras são financiadas por transferências federais constitucionais e por fundos especiais, tendo como fontes de recursos a riqueza gerada nos Estados e Municípios mais bem aquinhoados em termos de PIB, de renda e de patrimônio. É como se centenas e centenas de municípios brasileiros vivessem de mesadas do Governo Federal, embora preferissem investimentos para mobilizar suas potencialidades econômicas, gerando emprego e renda para a população. A sua esperança é que “as coisas mudam no devagar depressa dos tempos”, como já disse Guimarães Rosa.

Há que se destacar que o Brasil vivenciou duas experiências grandiosas de reestruturação da distribuição espacial das atividades econômicas. No ciclo de expansão econômica dos anos JK, as atividades se concentraram basicamente no Eixo Rio-São Paulo: de cada 100 novos empregos industriais gerados pelo Plano de Metas, 72 se localizaram nesses dois Estados, os mais bem dotados de infraestrutura econômica e social à época. No longo ciclo de expansão da polarização, as regiões e os Estados menos desenvolvidos passaram a crescer mais rapidamente do que São Paulo e Rio de Janeiro, graças às políticas de desenvolvimento regional concebidas e implementadas pelo Governo Federal.


Mas, é muito complexo o processo de desenvolvimento sustentável de uma região. Ainda hoje persistem as disparidades regionais de desenvolvimento no País, quando consideramos a renda per capita como um indicador do bem-estar social da população. Pode-se observar, pelos dados do IBGE sobre a renda per capita dos Estados brasileiros, que as disparidades ainda são muito acentuadas (dados de 2019). Os cincos valores menores são de Estados do Nordeste (Paraíba, Bahia, Piauí, Alagoas, Maranhão).


Numa leitura simples dos dados, pode-se dizer que o brasileiro paulista tem a chance de ter um padrão de vida 2,7 vezes melhor do que o brasileiro alagoano ou 3,1 vezes melhor do que o brasileiro maranhense. Essa comparação é realizada em termos médios e, portanto, não considera a questão da distribuição da renda e da riqueza em cada Estado. Assim, é possível que uma família rica em um Estado pobre possa ter um padrão de vida bem superior ao padrão de vida de uma família de classe média alta em um Estado rico.


As políticas de desenvolvimento regional do Brasil se basearam em investimentos públicos e incentivos fiscais e financeiros do Governo Federal, as quais perderam, atualmente, o seu poder de transformação, pois a profunda crise fiscal as torna ineficazes e supérfluas. Essas políticas precisam ser arquitetadas dentro de um novo projeto do desenvolvimento, em um país que se caracteriza por ser um dos mais socialmente desiguais do Mundo, de crescimento pífio face às suas imensas potencialidades, e que interrompe as suas políticas ambientais em benefício da tentação populista em favor de predadores dos ecossistemas. Um enorme desafio para o novo mandato presidencial a partir de 2023. O que leva os eleitores das áreas menos desenvolvidas a avaliar criteriosamente o que cada candidato à Presidência propõe como compromissos efetivos (e não apenas slogans genéricos) para a promoção do desenvolvimento sustentável das regiões em que habitam.


3. A arquitetura das novas políticas de desenvolvimento regional: O modelo das políticas de desenvolvimento regional, adotado no Brasil a partir da criação da SUDENE, em 1959, se exauriu à medida que o Governo Federal perdeu sua capacidade de financiar projetos de infraestrutura econômica e social em áreas menos desenvolvidas do País. Ao mesmo tempo, nos últimos anos, houve uma nova visão político-ideológica sobre o papel minimalista e neoliberal da intervenção direta e indireta do governo na solução dos problemas estruturais da economia brasileira, entre os quais tem prioridade a questão dos desequilíbrios regionais. Dessa forma, ao longo das últimas décadas, foram sendo elaborados e implementados novos modelos de políticas de desenvolvimento regional ou subnacional, destacando-se as seguintes dimensões conceituais:


a. mobilização de recursos latentes: O Professor Albert Hirschman afirmava que o potencial de crescimento de países e regiões com menor nível de desenvolvimento pode ser ampliado se as lideranças políticas e comunitárias conseguirem mobilizar os seus recursos latentes. Nesse caso, poderiam somar os recursos latentes aos fatores de produção tradicionais e multiplicar a capacidade da sociedade para equacionar os problemas de desenvolvimento econômico e socioambiental.


Recursos latentes são recursos humanos, tecnológicos e institucionais que permanecem subentendidos e não se manifestam à espera de uma oportunidade favorável para serem ativados, dependendo do modelo de desenvolvimento que se adote. Ou seja, somente emergem quando as circunstâncias político-institucionais são propícias para sua mobilização, quando as políticas públicas valorizam a endogenia e a participação na sua concepção e implementação.

Emergem, por exemplo, quando determinadas comunidades se organizam para realizar melhorias em suas condições habitacionais gradualmente. Nesse exemplo, os recursos latentes se manifestam por meio do espírito de iniciativa do empreendedorismo local, por eventuais poupanças financeiras e recursos materiais ociosos, pela capacidade de trabalho normal e extraordinário, pela criatividade em dar soluções inovadoras para antigos problemas, pela eliminação de desperdícios, etc. A mobilização de recursos latentes é mais apropriada para experiências descentralizadas, definidas de baixo para cima, como em projetos de desenvolvimento de arranjos produtivos locais ou de microrregiões que pressupõem “cooperar para competir”.


b. o modelo de desenvolvimento regional endógeno: Sergio Boisier tem insistido que o desenvolvimento de uma região ou localidade, no longo prazo, depende profundamente da sua capacidade de organização social e política para modelar o seu próprio futuro (processo de desenvolvimento endógeno), o que se relaciona, em última instância, com a disponibilidade de diferentes formas de capitais intangíveis na região ou localidade (capital institucional, capital humano, capital cívico, capital social, capital sinergético, etc.).


Percebe-se, com maior clareza, o conceito de desenvolvimento endógeno em situações de assimetria no retrocesso econômico. Celso Furtado cita como exemplo: se uma economia desenvolvida se atrofia ou involui por causa de um evento exógeno (por exemplo, países da Europa após a II Grande Guerra) e assume os indicadores de renda per capita, de comércio e de produtividade, etc., típicos de uma economia subdesenvolvida, quando recebe novos estímulos e incentivos (por exemplo, financiamentos e apoio técnico do Plano Marshall), a sua reação é rápida e acelerada, por causa de sua capacidade endógena de mobilizar capitais tangíveis e intangíveis para promover a retomada do desenvolvimento econômico e social. Por outro lado, os mesmos estímulos e incentivos, quando aplicados em áreas economicamente deprimidas com escassa disponibilidade de capitais intangíveis, podem gerar a reprodução das assimetrias e das desigualdades do contexto inicial.


Assim, um processo de desenvolvimento endógeno é concebido e implementado a partir da capacidade de que dispõe determinada comunidade para a mobilização social e política de recursos humanos, materiais e institucionais, em uma determinada localidade ou região. Um processo de desenvolvimento endógeno percorre, normalmente, algumas etapas:


· Não é um processo que brota no terreno do conformismo, da apatia, da inércia ou da passividade dos habitantes de uma região onde uma dinâmica de organização social e política ainda não se faz presente. Não há desenvolvimento onde não há inconformismo com relação ao mau desempenho dos indicadores econômicos, sociais e de sustentabilidade ambiental. Assim, numa primeira etapa, é importante organizar a estruturação desse inconformismo.


· A etapa seguinte tem sido procurar diagnosticar, técnica e politicamente, as razões e as causas do mau desempenho desses indicadores. Não se trata apenas de preparar documentos elaborados por especialistas, mas, principalmente, de conscientizar as lideranças políticas e comunitárias sobre o que deve ser feito para transformar as condições atuais, visando a obter melhores índices de desenvolvimento humano, de competitividade econômica, etc.


· A terceira etapa envolve a transformação de uma agenda de mudanças em um plano de trabalho de mudanças (Plano de Ação). Um plano de trabalho que seja não somente tecnicamente consistente, mas essencialmente gerado a partir de uma intensa mobilização dos segmentos da sociedade civil, em regime de pacto e parceria com as autoridades e instituições locais e supralocais.


Ao longo das últimas décadas, muitas experiências de desenvolvimento endógeno foram promovidas pelo SEBRAE, por Estados (Minas Gerais-1968, Ceará-1985, etc.), por Municípios (São Roque/MG, Crato/CE etc.).


c. planejamento para negociação: Historicamente observa-se que, a partir dos anos 1980, os Estados e as Regiões começaram a abandonar o estilo de planejamento clássico e caminharam em direção ao estilo de planejamento para a negociação. É princípio básico para a factibilidade do estilo de planejamento clássico que o número de objetivos e metas fixados deva ser pelo menos igual ao número de instrumentos que o Poder Público controla; ou seja, o Governo não pode estabelecer mais metas do que o número de instrumentos de política econômica de que dispõe.


A principal explicação para a emergência do planejamento para a negociação, ocorrida durante o ciclo do autoritarismo político iniciado em 1964, foi o esvaziamento, pelo Poder Central, dos instrumentos de política econômica de que os Estados e Regiões podiam lançar mão para atingir determinados objetivos de desenvolvimento econômico e social. O planejamento passou, então, a ser compreendido como o desenvolvimento máximo da capacidade latente de negociação, onde se tornava dominante a disputa por recursos de fundos e programas definidos exogenamente pelas agências nacionais e internacionais de planejamento e de fomento, portanto dentro de um novo estilo de planejamento para a negociação.


Desde o final dos anos 1980, com o avanço da redemocratização do País e a ampliação das eleições diretas para todos os níveis de Governo, novas funções de planejamento foram se acoplando às administrações estaduais, destacando-se as funções de reprogramação endógena, de compensação e de ativação social. A estratégia de reprogramação endógena visa a reorientar a alocação dos recursos da administração direta e indireta sob o controle do Poder Público Estadual para atender, em termos de eficiência e de eficácia, às mudanças em sua agenda de desenvolvimento (ver, por exemplo, as experiências de choque de gestão ou de orçamento de base-zero). A estratégia de políticas compensatórias que procura analisar os efeitos das políticas macroeconômicas e setoriais do Governo Federal sobre economias estaduais específicas, através da discriminação espacial de sua operação ou através da obtenção de ações compensatórias. E, finalmente, a estratégia de ativação social: que procura mobilizar recursos latentes nas economias estaduais até então não mobilizados em virtude do padrão de organização política do processo de crescimento econômico adotado.


Essas estratégias são razoavelmente realistas e factíveis, na medida em que dependem de recursos institucionais (reprogramação), de recursos políticos (compensação) e de recursos de mobilização (ativação) que, com maior ou menor nível de abrangência, estão sob controle do Poder Público Estadual. De fato, não há muitos instrumentos próprios fiscais e financeiros de políticas de desenvolvimento que possam ser acionados com autonomia pelos Governos Estaduais, com exceção das Unidades da Federação com maior superávit fiscal, como é o caso de São Paulo.


Enfim, há muitas alternativas para se promover um processo de planejamento de médio e de longo prazo nos Estados, desde que se dê ao conceito de “recursos para o desenvolvimento” uma abordagem mais abrangente do que a mera abordagem de recursos fiscais e financeiros.


Apesar das políticas de desenvolvimento regional, formuladas e executadas a partir da criação da SUDENE, em 1959, terem atenuado o desequilíbrio de desenvolvimento entre as regiões brasileiras, as condições de vida de um brasileiro ainda dependem da loteria da vida da região em que nasce, dado o nível ainda prevalecente nas assimetrias de desenvolvimento sustentável, com muitas áreas economicamente deprimidas, lado a lado com as áreas mais prósperas industrializadas ou em expansão nas fronteiras agrícolas e minerais do País. Entretanto, o modelo de desenvolvimento, que dependeu dos mega superávits primários do Governo Federal, se exauriu com a crise fiscal e financeira e com a má gestão das políticas econômicas. O tempo é de renovação de ideias e de lideranças políticas com as dimensões de estadistas, que não tenham receio de perceber e confrontar os problemas fundamentais da sociedade e “fazer o que precisa ser feito”.


*Paulo Roberto Haddad - Ex Ministro da Fazenda e do Planejamento e Conselheiro do Fórum do Futuro

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